Sobre a Gratidão
A gratidão nasce do reconhecimento, da satisfação, da aceitação, da devoção, da entrega e da fé. Se nós não sabemos dizer um obrigado, não podemos ter esse sentimento de maneira verdadeira. Agradecer pode ser por educação, costume ou sentimentalismo. Mas também pode ser movido pela necessidade de expressar um sentimento que vem do coração.
Pode ser mais fácil falar de ingratidão do que de gratidão e um pode estar por dentro do outro. Porém, temos que perceber o que nos impede de expressar tal sentimento. É preciso analisar e refletir sobre isso. Muitos dizem que levantam as mãos para os céus todos os dias para agradecer. Porém, logo depois começam a reclamar de tudo. Isso é totalmente contraditório.
Por exemplo, dizemos que agradecemos pelo emprego, mas também queremos um salário maior, mais tempo para descansar, menos cobrança e reclamamos de todos que trabalham conosco. Reclamamos tanto que não é possível entender do que estamos agradecendo já que nada parece estar bom. Outros dizem que são gratos pela vida que tem, mas reclamam dos filhos, cônjuges e família.
Quando se trata de dinheiro, nunca estamos satisfeitos. Não importa a forma com que ele chegue até nós. Quando perdemos algo ou alguém, ficamos tristes, com raiva e nos sentimos arrasados, sem planos para o futuro. Com a visão nublada pelos nossos apegos e desejos, não conseguimos ver e sermos gratos pelo que já tivemos. Pensamos apenas no que deixamos de ter e no conjunto de projeções mentais de coisas que ainda não aconteceram.
Os nossos julgamentos, reclamações e críticas demonstram ingratidão, intolerância e desrespeito. Estamos sempre reclamando, seja do garçom do restaurante, do lixeiro, de entregadores, do tintureiro, do padeiro, do frentista e do caixa do mercado. Sendo que, todos estão nos prestando serviços, nos ajudam de uma forma ou de outra e facilitam a nossa vida. Nós nos achamos independentes, superiores, mas somos profundamente dependentes uns dos outros e estamos profundamente ligados fisicamente. Deveríamos ser gratos até aos pedintes e aos necessitados, que nos possibilitam a prática de caridade e abrem nossos corações.
Ao invés de sermos gratos às inteligências que – apesar de toda a destruição que fizeram na natureza, chegando a alteração do clima – trazem o sol e a chuva, mas nós reclamamos destes eventos que garantem as colheitas de nossas lavouras. Pior ainda, mal dizemos a Divindade quando a sequência destes eventos – causada exatamente por estas nossas interferências na natureza – ocorre de tal maneira a nos “prejudicar”. Não pode haver uma genuína gratidão se nos culpamos ou culpamos os outros. A gratidão se mostra em fatos concretos, ações e atitudes. Onde há culpa, há também raiva, descontentamento e insatisfação.
Quando dizemos que os outros devem mostrar gratidão, estamos projetando a nossa própria ingratidão. Quando dizemos que temos gratidão por vários motivos, estamos tentando provar para nós mesmos que temos algo que, na realidade, não temos. É a gratidão de fariseu. A inveja também esconde muita ingratidão. Se queremos as coisas que os outros possuem, então não estamos contentes com o que temos, não somos gratos e não reconhecemos o que recebemos. Assim como existe uma inveja destrutiva, que leva as pessoas a quererem destruir as outras a estragar o que elas possuem, também existe uma outra inveja auto destrutiva, uma mágoa, uma ingratidão, raiva, revolta.
Sentir-se como vítima é ingratidão. É o véu do orgulho, da vaidade, da auto adoração e do amor próprio que nos impede de perceber quando deveríamos expressar gratidão. Nós nos cremos responsáveis por tudo aquilo que nos acontece de bom e culpamos os outros por tudo aquilo que acontece de ruim. Nós nos cremos dignos, merecedores, de tudo que nos acontece e assim não conseguimos ser gratos.
O autoconhecimento é muito importante neste processo. Ele nos leva a perceber que fizemos o que podíamos com o tanto de conhecimento e de ignorância que tínhamos em cada situação. Assim, conseguimos perceber que nossos pais e professores também fizeram o que estava ao seu alcance a partir do que tinham. Essa percepção nos leva à gratidão, não apenas como uma teoria bonita, mas sim uma percepção profunda, livre de ressentimentos.
Nossa Divindade interior e mais uma série de Seres nos ajudaram e nos impulsionaram a chegar onde estamos. Nos ajudaram a passar por uma série de experiências, a chegarmos às instituições e aos grupos que pertencemos. De forma que, ao virarmos as costas a estas coisas, aos ensinamentos e aos Mestres, nós nos mostramos ingratos. Mais uma vez, a gratidão se mostra em fatos concretos, em ações e em atitudes.
Oferecer cada boa ação à Divindade é uma forma de agradecer. Diferente daquele ato de vaidade e arrogância onde tomamos tudo para nós mesmos. Demonstrar gratidão é bom para si próprio e não para os outros. Quando julgamos mal e criticamos as doações de outras pessoas, estamos sendo ingratos e estamos projetando uma série de defeitos.
Compreender as dificuldades da vida como lições a serem aprendidas é um enfoque diferente, é uma grande mudança de paradigma e de visão da vida. Esta é uma reta visão sobre o sofrimento e esta visão reta nos enche de gratidão. Evidentemente ela não diz respeito ao que normalmente chamamos de aprendizagem, mas que não passa de mágoas, ressentimentos, medos, repressões e criação de dispositivos de defesa.
Se passamos a ver as dificuldades da vida como lições a serem aprendidas, se o importante na vida passa a ser o aprendizado e a evolução através dele, então não existe mais ofensa, agressão e pressão. Mas, quando ficamos nervosos, irritados e maldizemos alguém ou alguma situação é porque algo passou a ser mais importante que o aprendizado. Olhamos as situações da vida com a mente cheia de ideias e com o coração vazio. Precisamos mudar isso. Precisamos olhar os fatos da vida com a mente vazia, livre de conceitos e preconceitos.
Por Fabio Balota
(2007)