A Recordação de Si Mesmo
No dia a dia, muitos vivem no piloto automático, como se estivessem em um transe, distraídos e iludidos pelas seduções da vida. O trabalho, os prazeres do mundo, as preocupações cotidianas nos mantêm em um estado de sono profundo, de consciência adormecida.
Esse sono é alimentado pela fascinação, uma espécie de encanto que nos faz perder de vista nossa própria essência. Cada um tem suas próprias distrações: o viciado em bebida, o narcisista diante do espelho, o avarento contando suas riquezas. Em todos esses casos, esquecemos quem realmente somos.
Quando esquecemos de quem somos, nos identificamos com o corpo, o nome, nossa história e passamos a perceber a realidade a partir de um ponto de vista ilusório, equivocado.
Para acordar desse estado letárgico é preciso esforço, decisão, persistência, é preciso desenvolver auto-observação, atenção plena, estado de presença, é preciso manter uma postura reflexiva, investigativa, questionadora. Onde estamos? Onde está nossa atenção? Estamos aqui no mundo físico, ou em astral, ou num sonho? Como cheguemos aonde estamos? O que estamos sentindo? O que nos fez sentir isso?
Esquecidos de nós mesmos, com a mente embotada, a consciência adormecida, tomamos tudo com a última verdade, a última realidade, justificamos tudo que acontece dentro e fora de nós mesmos. Como num sonho, absurdos acontecem, mas não questionamos, nos vemos em lugares e situações que nunca estivemos, mas não questionamos. Se achamos estranho, logo justificamos e pronto. Fazemos a mesma coisa o tempo todo no estado de vigília, vemos absurdos e banalizamos, mudanças enormes acontecem em nosso comportamento e justificamos. Assim, seguimos adormecidos, esquecidos de nós mesmos.
Se alguém despertasse e se desse conta de si mesmo e do que está acontecendo num momento de ira, de briga, de escândalo, ficaria tão surpreso, assustado, envergonhado e ao mesmo tempo tudo cessaria.
Quando ocorrem momentos de grande alegria, de êxtase, de amor, de gratidão, como não estamos atentos, observando, como achamos que vieram de fora, que aconteceram, perdemos uma grande oportunidade de despertar. Observar as mudanças é fundamental.
O despertar da consciência nos permite enxergar além das aparências, romper os véus da ilusão, superar os condicionamentos, transcender as limitações da mente e acessar uma nova percepção da realidade.
Uma das coisas mais importantes para despertar é abrir-se a possibilidade de estar adormecido. Enquanto acreditarmos que estamos despertos, nada poderá mudar. Tentar lembrar de si mesmo é tentar acordar, é tentar despertar.
A recordação de si mesmo é um estado que se alcança com esforço, com vontade. No começo, esses estados são passageiros, pois logo caímos no esquecimento novamente. Mas, com esforço constante, os estados vão se tornando mais frequentes, duradouros, profundos, estáveis.
Por Fabio Balota e Natalino Sampaio